POR FÁBIO CHAP
Hoje eu joguei a sua escova fora. Não dava mais pra te guardar. Todo dia eu era obrigado a ficar de frente pras lembranças da gente. Todo dia eu limpava meus dentes enquanto sujava meu coração. Lembra a bundada que eu te dava pra conseguir mais espaço na pia? E a gente ria… E ria!
Eu não quero aqui pensar com quem você está ou quem tá prestes a amar. Meu peito não aguentaria te ver na fila do mercado comprando nosso suco de uva pra outro. Ou nosso vinho chileno pra outros.
Hoje eu joguei a sua escova fora porque sempre chega a hora da gente seguir em frente. Faz tanto tempo, mas até ontem eu tava andando meio de lado. Quase que pra trás. Não dá mais pra te pensar dia-e-noite.
Lembra daquele dia em que a gente caiu na piscina? Você me empurrou, mas eu rápido que sou, peguei no seu braço e te levei junto. Você riu, eu gargalhei. Ali eu era um rei. O cara mais feliz do mundo. Um homem realizado até último fio de cabelo. Como era lindo o seu cabelo na hora que a gente rolava na cama.
Mas isso é passado. Hoje não tem piscina, não tem temaki, não tem edredom. Hoje não tem sua cama, minha pia, minha varanda. Era lá que nosso corpo fazia samba e heavy metal, até valsa. Era lá que a minha calça descia ao chão e a tua calcinha ia pro lado. Nosso pecado era forte. Era fundo. Era tudo.
Caralho! Que pensamento idiota. Eu não queria escrever isso. Porque escrever isso é lembrar disso. E eu não posso. Joguei a sua escova fora exatamente pra que, a partir de agora, você seja só história, não mais desejo.
Meu medo é falar da boca pra fora. Porque essa dor tá pegando é do peito pra dentro. Ai! Quem me dera sair nas ruas e ver graça nos sorvetes, nas crianças, no sol que hoje tá tão bonito. Mas eu só sei prestar atenção nos casais de mãos dadas. E pensar – sufocado de angústia – que não estou mais num desses pares românticos que se beijam nas esquinas e na porta dos restaurantes.
Agora nós dois somos isso; ou seja: mais nada. Vou ter que aprender a lidar. Esse sou eu: um ateu que, olhando pro céu, anda pedindo favores com os joelhos no chão. Um ateu que se pega pedindo a Deus pra aprender a lidar com a sua falta, com as suas costas, com o seu adeus.
**